26 de jan. de 2015

Adaptações Audiovisuais de “Orgulho e Preconceito”


Como sou apaixonada pela Jane Austen, especialmente por seu romance "Orgulho e Preconceito, me inspirei nessa obra para meu Trabalho de Conclusão de Curso. Sendo assim, fiz uma análise da adaptação fílmica de "Orgulho e Preconceito", dirigida por Joe Wright, e para série de TV , produzida pela BBC. Dessa forma, o texto que se segue pode não ser tão legal, por ter uma estrutura bastante acadêmica, mas contém as principais conclusões resultantes de minha análise.

Pude perceber que a maior vantagem do filme e da série, em relação ao livro, é a utilização das imagens, que falam sem precisar de palavras. Como Xavier destaca, “além de ser a expressão não discursiva de algo – a ideia é de que o cinema não fala das coisas, mas as mostra” (XAVIER, 1977. p. 86). Enquanto o livro precisa descrever tudo, a imagem pode se utilizar de olhares, expressões e gestos para brincar com os sentimentos e a imaginação do espectador. Um exemplo é a cena presente no filme em que Darcy e Elizabeth dançam no baile de Netherfield. Ambos param de conversar, só se olham, e todas as outras pessoas desaparecem do salão. Isso poderia ser descrito no livro, mas talvez não causasse tanto impacto. Dizer que “ambos se olhavam profundamente e continuavam dançando, tão absortos um no outro que era como se não houvesse mais ninguém no salão” seria dramático, interessante, mas talvez não tanto quanto ver isso. Levando em consideração que “no cinema e na literatura exercitarmos nossa imaginação e vivenciamos o prazer da criação através das imagens na tela e nas páginas dos livros (...). Sentimos prazer em manipular ideias, em lidar com representações de situações imaginárias” (PIETROCOLA, 2004. p. 10), podemos perceber, no entanto, que quando lemos, nossa imaginação se ocupa, em parte, na criação de imagens, já quando você é exposto diretamente à imagem, sua imaginação pode se ocupar com outras coisas, se aprofundando na dramaticidade do momento. De acordo com Sylvia Novaes

“Se o sentido do texto nos dá a impressão de ser único e fixo (embora seja, também ele, passível de várias leituras) e capaz de abstrações e generalizações, imagens têm uma natureza paradoxal: por um lado, estão eternamente ligadas a seu referente concreto, por outro, são passíveis de inúmeras ‘leituras’, dependendo de quem é o receptor.” (NOVAES, 2008. p. 03).

Portanto, imagem e texto, apesar de tratar da mesma coisa, neste caso a obra “Orgulho e Preconceito”, por serem plataformas distintas, podem gerar interpretações diferentes, estimulando a imaginação do receptor, cada um a sua maneira, visto que “se o texto nos diz sobre algo, o filme nos convida a descobrir. Esse processo de descoberta, principalmente nos filmes, é acompanhado por um processo de imaginação” (NOVAES, 2008. p. 06).

Em relação aos diálogos e conflitos mais importantes, presentes na obra original, todos estão presentes tanto no filme quanto na série, a principal diferença é que, por ser uma plataforma diferente, as situações em que alguns diálogos ocorrem acabam sofrendo certas modificações, sem que isso abale o sentido da história. Devido à falta de tempo presente no filme para o detalhamento de certas situações, alguns momentos do livro e seus diálogos ocorrem em situações diferentes, às vezes sendo mesclados em uma única situação. Já na série, existem mais momentos representados, com seus diálogos específicos, devido à maior disponibilidade de tempo. De acordo com Robert Stam, a redução do tempo do filme pode restringir detalhes da história, prejudicando a narração e o entendimento do telespectador, o que não acontece nessas adaptações. Por mais que a série tenha conseguido reproduzir mais momentos com um nível maior de fidelidade, isso não alterou a linha principal da história, quando comparada ao filme.

Levando-se em consideração o que Robert Stam propõe

“Nós ainda podemos falar em adaptações bem feitas ou mal feitas, mas desta vez orientados não por noções rudimentares de ‘fidelidade’ mas sim, pela atenção à ‘transferência de energia criativa’, ou às respostas dialógicas específicas, a ‘leituras’ e ‘críticas’ e ‘interpretações’ e ‘re-elaboração’ do romance original, em análises que sempre levam em consideração a lacuna entre meios e materiais de expressão bem diferentes” (STAM, 2006. p. 51)

Estas adaptações, portanto, podem ser consideradas como de boa qualidade, pois capturaram a essência e o espírito de todos os personagens, de suas relações e seus conflitos.

     O filme e a série são fieis à obra original à medida que, apesar de não retratarem os acontecimentos exatamente como estão escritos no livro (por mais que a série consiga fazer isso melhor que o filme, alguns pequenos acontecimentos ainda deixaram de ser representados), ambas capturam sua alma. O importante em uma adaptação é conseguir transmitir ao telespectador os sentimentos que a obra propõe que sejam sentidos. Por serem duas plataformas diferentes, uma escrita, outra audiovisual, não podem ser comparadas de forma direta.

Vale ressaltar que, apesar de os fatos terem sido bem retratados, ambas as produções possuem “erros de temporalidade”. No filme, o erro ocorre no final, com a visita de Lady Catherine. Para a época, considerando também a idade avançada da personagem, seria inviável que ela viesse de Rosings Park, visitasse Elizabeth no meio da noite e, de lá, partisse para Netherfield para, na mesma noite, falar com seu sobrinho. Já na série, o erro ocorre com os pedidos de casamento feitos por Mr. Collins. O segundo episódio termina com a recusa de Elizabeth a seu pedido e o episódio seguinte se inicia com o anúncio de seu noivado com Miss Lucas. A ausência de qualquer acontecimento entre as duas propostas, apesar do intervalo entre o fim de um episódio e o início de outro, faz parecer que as propostas foram feitas uma logo em seguida da outra, o que, para a época, considerando as regras de etiqueta e bons costumes, seria inaceitável e causaria grande escândalo. Apesar de existir esse erro nas duas adaptações, no filme, por mais inviável que fosse a situação, por mais absurdo que pudesse parecer, para a época, tudo acontecer tão rápido, na mesma noite, visto que os meios de transporte eram precários, bem como as estradas, sem contar a idade de Lady Catherine, que impediria que ela tivesse disposição para tal jornada, a forma como esses fatos foram engendrados conferiu mais emoção ao filme, apesar de tornar essa parte menos verossímil. A série, por sua vez, ao cometer o erro de temporalidade da forma que foi feito, não acrescentou nenhuma emoção ao enredo, deixando apenas uma possível situação de desconforto e confusão no espectador.

Fora essa questão dos erros de temporalidade, pode-se perceber que o filme trabalha mais emoções, enquanto a série trabalha melhor os fatos. Por ter mais tempo, a série conseguiu reproduzir mais diálogos presentes no livro, sendo mais literal e atendo-se aos fatos. Já o filme é mais lúdico. Por ter menos tempo para dar tantas explicações, explora closes, momentos de silêncio e contemplação que deixam muitos pontos subentendidos, sem precisar gastar muito tempo com explicações. O filme dá mais liberdade de interpretação ao receptor. Exemplos de situação onde isso acontece são os closes na mão de Darcy, que refletem o momento em que Darcy luta contra os sentimentos que começa a nutrir por Elizabeth, bem como o momento em que ele para de lutar contra esses sentimentos, a dança entre ele e Elizabeth no baile em Netherfield, em que parece que eles são as únicas pessoas no salão, o momento em que Elizabeth está parada a beira de um penhasco e o espectador tem liberdade para imaginar os conflitos internos da personagem, o que se passa por sua mente, entre outros momentos. A série, por sua vez, segue mais literalmente os acontecimentos do livro, deixando de criar momentos emocionantes que não estão presentes no livro.

Justamente por trabalhar melhor as emoções, percebe-se que, apesar de todos os personagens terem sido retratados de forma fiel tanto no filme quanto na série, existem momentos, no filme, em que a interpretação dos atores conseguiu refletir melhor o que se passava em seu interior. Dois momentos principais são o pedido de casamento de Bingley a Jane e Mr. Bennet dando permissão para que Elizabeth e Darcy se casem. No caso de Jane, na série, a atriz interpreta estar muito feliz, mas demonstra uma felicidade muito controlada. No filme, entretanto, a atriz enrubesceu, tremeu, apresentou várias reações físicas que demonstravam que, apesar de ter uma personalidade mais contida, estava sentindo tamanha felicidade que não conseguia disfarçar. Já no caso do momento em que Mr. Bennet conversa com Elizabeth sobre seu casamento com Darcy, ambos foram melhor interpretados no filme. Elizabeth, na série, explica a seu pai os motivos que a levaram a se apaixonar por Darcy de forma controlada e racional, enquanto que, no filme, a atriz consegue demonstrar que, apesar de toda racionalidade da personagem, seus motivos para querer se casar com Darcy vão além da razão, ela realmente o amava. Mr. Bennet, por sua vez, foi melhor interpretado no filme, pois na série também é muito racional. No filme, consegue deixar evidente o amor que sente pela filha, a felicidade que sente por ver sua filha feliz e, ao mesmo tempo, a falta que sentirá dela.

     Pode-se perceber, portanto, que o filme, com sua limitação de tempo, cumpre seu desafio, criando cenas originais, que conseguem condensar muitas partes da obra em um só momento. A série, por sua vez, consegue detalhar melhor os fatos, tal como acontecem no livro, também criando certos momentos, como as cenas de Darcy em busca de Lydia e Wickham, que, sem fugir dos fatos, trouxeram mais emoção para a adaptação. Estas produções, portanto, atingem seus “objetivos”. Sem deixar de serem trabalhos originais, transmitem ao telespectador tudo que deve ser transmitido para quem lê o livro, e socializam o conhecimento presente na obra. Não são meras produções da indústria cultural massificada com objetivo de lucro, transmitem os conflitos internos dos personagens, os conflitos da própria história, a personalidade de cada um, de forma clara e literal, ou através das pequenas sutilezas, como no caso do filme, demonstrando que uma obra literária pode possuir muitos desdobramentos criativos a serem explorados como forma de arte.

Por: Marina Abreu

2 comentários:

  1. Ai, amei esse texto! Sou louca por Jane Austen e Orgulho e Preconceito é o meu favorito. Assisti tanto a adaptação da BBC quanto o filme de Joe Wright em 2005 e, este último se tornou o meu favorito principalmente por Matthew Macfadyen ter interpretado Darcy.

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  2. Boa tarde flor adorei seu cantinho e já estou me instalando aqui, obrigada pela visita tenha uma semana iluminada

    Bjsss da Danzoka

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